COP14 Biodiversidade “Preparar o caminho para uma finança pró-natureza”

publicado em 14 November 2018
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A 14a Conferência das Partes da Convenção sobre a Diversidade Biológica será realizada em Sharm El-Sheikh, no Egito, de 13 a 29 de novembro de 2018. Para Gilles Kleitz, Diretor do Departamento de Transição Ecológica e Recursos Naturais da AFD, trata-se de uma etapa importante para a preparação de um acordo global em 2020 sobre a biodiversidade, que permitirá finalmente considerar de forma mais ampla o capital natural e os ecossistemas na economia mundial.
Mais de 25 anos depois da sua entrada em vigor, em que ponto está a Convenção sobre a Diversidade Biológica?

A convenção de Rio originou muitos avanços... Ela permitiu que cada país implementasse a sua estratégia nacional para a biodiversidade. Ela acompanhou o lançamento de um plano mundial de desenvolvimento das áreas protegidas, ou ainda estabeleceu o princípio da biodiversidade como bem público acessível por todos, para evitar o risco de apropriação indevida. As metas de Aichi (20 objetivos ligados à biodiversidade para o período 2011-2020) também resultaram dela.

No entanto, essas recomendações e propostas não têm caráter vinculante. As estratégias nacionais não possuem um verdadeiro sistema de prestação de contas. E os esforços interministeriais, especialmente em setores chave como indústria, transporte, agricultura ou desenvolvimento urbano, foram insuficientes. 
 
 

Gilles Kleitz, expert Transition écologique
Gilles Kleitz © AFD

Qual o objetivo dessa 14a Conferência das Partes?

Em primeiro lugar, trata-se de preparar o acordo que deve ser adotado em 2020 em Pequim durante a COP 15. O acordo de Pequim será o equivalente para a biodiversidade do Acordo de Paris para o clima, ou seja, um acordo mundial e global que permita inverter, sistemática e ambiciosamente, o fenômeno de degradação do capital natural. Ele incluirá compromissos nacionais, com reconhecimento de responsabilidade, e com um modo de compatibilidade homogêneo que possa ser comparado com o esforço mundial a ser realizado.

O que vai estar nas mentes em Sharm El-Sheikh é a arquitetura desse acordo. Por exemplo, devemos fortalecer as estratégias nacionais ou imaginar planos setoriais muito mais proativos? Os mandatos governamentais para a COP devem permanecer no escalão dos Ministros do Meio Ambiente ou passar para os chefes de governo? Muitos pontos estratégicos vão ser evocados, de maneira formal ou nos bastidores.
Quais temas serão levados pela AFD para Sharm El-Sheikh? 

No Forum Business et Biodiversité, acabamos de apresentar o grupo de trabalho sobre a biodiversidade criado pelo Clube dos Bancos de Desenvolvimento (IDFC). A ideia é simples: qualificar melhor os impactos, positivos como negativos, relacionados com os financiamentos dos bancos de desenvolvimento. Esse é um ponto essencial que permitirá aprimorar o diálogo com as empresas envolvidas. Algumas entre elas já estão trabalhando sobre a contabilização da dependência das suas atividades para com a biosfera.

Como agência pública de financiamento do desenvolvimento, o nosso papel é melhorar os nossos padrões e o impacto dos nossos investimentos, como também incentivar os atores econômicos a adotarem uma abordagem de progresso. É essencial abrir o caminho para uma finança pró-natureza.

A outra preocupação da AFD é formalizar as soluções propostas aos países africanos para preparar esse acordo global sobre a biodiversidade. Trabalhamos com a ideia de um fundo exclusivamente dedicado a esse apoio.

É possível deter a perda de biodiversidade?

Sim, se nos orientarmos pra uma melhor remuneração do capital natural! São produzidos hoje 80.000 bilhões de dólares de PIB por ano na escala mundial, mas dedicamos apenas 50 a 60 bilhões para a manutenção dos ecossistemas... Menos de um milésimo. É muito pouco, comparado com todos os serviços e as soluções prestadas pela natureza. É muito pouco para aquilo que se assemelha a um seguro de vida para a humanidade.

Remunerar melhor significa que a pesca pague um pouco mais para a manutenção dos oceanos, que as madeireiras paguem um pouco mais para a manutenção das florestas, que as indústrias e manufaturas reduzam bastante todos os seus impactos, que os políticos votem verbas maiores para a natureza, que a finança considere um pouco mais o impacto dos seus investimentos, que o ordenamento compense as superfícies impermeabilizadas, que os consumidores contribuam para uma maior exigência etc. É um conjunto que envolve todos.

Segundo as projeções, seria necessário investir entre 0,1 e 0,2% do PIB mundial na manutenção da biodiversidade para inverter o fenômeno. É muito, mas é possível. É um empenho menor do que aquele necessário para a transição para uma economia sem carbono.

O que impede atualmente essa inversão?

No contexto atual de crise ecológica, a biodiversidade e o seu valor são extremamente fortes, desde que projetados em um prazo muito longo: 30, 50 anos e mais. Mas não conseguimos considerar o longo prazo. Atualmente, a economia recompensa sobretudo o curto prazo.

Levar a biodiversidade em consideração implica renovar o nosso marco de pensamento – e de análise econômica – para melhor integrar o longo prazo, isto é, o planeta.

Em campo, quais soluções concretas são apoiadas pela AFD?

Financiamos muitos projetos exemplares de áreas protegidas. É o caso da  floresta de Marsabit, no Quênia: apoiamos um espaço que é, antes de tudo, um banco de recursos naturais – água, madeira, forragem, animais – para todo um território e as suas populações.

O projeto fortalece esse espaço e a partilha dos recursos em sua periferia. Ele permite estabilizar um território e inseri-lo em uma dinâmica de longo prazo.
Ajudamos os nossos parceiros a estruturar áreas protegidas viáveis do ponto de vista econômico, isto é, que conservem a natureza assim como o valor no plano local, com o turismo, o artesanato... Não se trata de pôr os parques numa redoma!

Ao converter espaços naturais em plantações ou em cidades para responder a necessidades urgentes de curto prazo, habitações ou moradias, produz-se muito valor de uma só vez, mas em 50 anos, esse valor se perde... Se não tivesse sido destruído, o valor extraído do ecossistema teria sido muito maior. Esse é um dos motores do drama atual. Os ecossistemas produzem valor; mais vale conservá-lo por prazos muito longos e utilizar os seus produtos sem destruir o capital.


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