3000
crianças de Mayotte sensibilizadas
200
educadores formados na ilha desde fevereiro de 2018
46985
crianças beneficiárias das ações da Play International, na França, em 2018
Departamento mais jovem da França, com mais de metade da população com menos de 18 anos, Mayotte cristaliza uma série de desafios ligados à educação. Um terreno fértil para as ações pedagógicas da ONG Play International que, através do esporte, luta contra todas as formas de exclusão, inclusive as deficiências e as desigualdades de gênero. Reportagem em companhia do campeão paraolímpico Arnaud Assoumani.

O que impressiona o visitante recém-desembarcado em Mayotte é sua juventude. Em toda parte, crianças descem as ruas apressadas, ecoando seus gritos alegres para tomar os ônibus escolares. Mais de um terço da população (37%) do 101o. departamento francês vai à escola, e a taxa de natalidade é de cinco filhos por mulher. Uma grande riqueza para este território do oceano Índico, desde que essa juventude beneficie de acompanhamento. A ONG Play International entendeu perfeitamente a importância desses desafios educacionais, numa região onde atua desde 2016.

Apoiada pela Agence Française de Développement (AFD), esta associação de solidariedade internacional, que utiliza o esporte como alavanca de transformação social, implementou diferentes tipos de projetos em Mayotte, em torno do "viver juntos". Ela forma animadores e educadores periscolares e professores da Educação Nacional à "playdagogia", um método que permite conscientizar as crianças e estimulá-las a se exprimirem sobre assuntos como a laicidade ou a exclusão, através de jogos. 

Em maio de 2019, acompanhada do atleta paraolímpico Arnaud Assoumani, a Play International animou workshops de playdagogia em Mayotte focados nas desigualdades entre meninas e meninos, em parceria com os stakeholders locais, pois, como destaca o diretor da ONG David Blough, "a educação é um esporte coletivo!".
 

Mayotte, Play international, jogo
Mayotte, Play international, Arnaud Assoumani
A igualdade entre meninas e meninos, um trabalho de equipe
Para combater as desigualdades entre meninas e meninos em Mayotte, a Play International lança, em parceria com a AFD, um programa pedagógico que utiliza o jogo esportivo para transmitir mensagens de prevenção e sensibilização junto às crianças. Concebido com e para os stakeholders locais, este projeto federou uma série de partes interessadas da ilha: educadores, institucionais e coletividades locais.

Mesmo se as mentalidades evoluem rapidamente na ilha, o índice de emprego dos homens ainda é muito superior ao das mulheres (45% contra 29%) e um quinto das maiotenses declaram já ter sido fisicamente agredidas em suas vidas. Partindo desta constatação, a Play International desenvolveu, desde 2016, no departamento, um método pedagógico que utiliza o jogo esportivo como vetor de prevenção e conscientização para a igualdade entre meninas e meninos, apoiado em 2018 e 2019 pela AFD à altura de 50 000 euros.

Concebido com e para os stakeholders locais, este método baseia-se no spin-off. Assim, desde 2018, 200 profissionais de educação e animação do departamento foram formados em "playdagogia": professores da escola de Foundi Adé, em Mamoudzou (sede do município), todos os animadores dos dois municípios de Petite-Terre, bem como diversos outros stakeholders locais. A partir de agora, cada um desses profissionais pode propagar este método. "Formamos onze orientadores pedagógicos de cada circunscrição do vice-reitorado que se encarregarão, por sua vez, de formar os professores", conta animada Claire Chauvet, coordenadora local da Play International.

"O que fazemos aqui, em termos de pedagogia, é algo jamais visto", diz um professor de educação física e esportiva, que elogia o trabalho de equipe de todos os stakeholders do território. "Aqui, todo mundo trabalha junto: professores, animadores, vice-reitorado, direção da juventude, dos esportes e da coesão social, associações e coletividades locais. Temos sorte!", entusiasma-se a professora.

"Desenvolver ao máximo o esporte através do acompanhamento dos municípios maiotenses é uma das prioridades da AFD", explica seu diretor-adjunto local, Kévin Cariou. "É graças a este trabalho com os municípios que somos conhecidos aqui", prossegue, destacando o engajamento da AFD junto às coletividades que, em Mayotte, estão em fase de estruturação e precisam ser acompanhadas financeiramente em seus projetos.

Assim, quatro municípios da ilha são parceiros da Play International e organizam sessões de playdagogia visando a educação cívica e a sensibilização das crianças à igualdade entre meninas e meninos: Bandraboua (Norte), Chirongui (Sul), Labattoir e Pamandzi (Petite-Terre). No 101o. departamento francês, quase 3000 crianças puderam beneficiar desse programa. Um dispositivo que apresenta "bons indicadores de desempenho social, graças às equipes (…) e a uma política educativa de parceria", elogia Laurent Maillet, orientador pedagógico departamental de Educação Física e Esportiva no primeiro grau.

As crianças conscientizadas transmitirão elas mesmas estas mensagens de prevenção ao seu círculo familiar e a outras pessoas à sua volta, prosseguindo, assim como a Play International e seus parceiros, a transição para um mundo mais igualitário.
Mayotte, Play international, Arnaud Assoumani
Arnaud, o voo rumo à igualdade
Nascido sem o braço esquerdo, o atleta de alto nível Arnaud Assoumani teve que superar bem mais que provas olímpicas. Aos cinco anos, sonhava ser um desses esportistas que "voam no ar". Dezoito anos depois, ascendeu aos céus ao ganhar a medalha de ouro de salto a distância nos Jogos Paraolímpicos de verão de 2008 e ao bater o novo recorde mundial em sua categoria, a 7,82 metros, em 2010. Após ter conhecido uma série de dificuldades, finalmente conseguiu realizar seu sonho de menino. Vetor de esperança e embaixador da Play International, ele está implicado a seu lado para ajudar a desenvolver positivamente o percurso de vida das crianças. Esta colaboração, que já dura quatro anos, "aconteceu naturalmente, porque eu também defendo valores em prol da diferença, da diversidade e da igualdade", explica o campeão.

"As soluções que a associação propõe podem contribuir para que os futuros adultos sejam mais abertos, respeitosos e compreensivos", estima. Para ele, o esporte é uma formidável alavanca de desenvolvimento pessoal, como demonstra sua história. "No contexto do esporte, temos todos as mesmas regras, jogamos todos da mesma maneira. Pouco importa nossa cor de pele, nosso sexo, etc., vamos compartilhar a mesma experiência, e é isso que conta", defende.

Arnaud Assoumani foi a Mayotte em maio de 2018 para animar um primeiro workshop de "playdagogia" sobre as desigualdades entre meninas e meninos, com crianças de 10 a 12 anos. Esta ocasião lhe deu a oportunidade contar sua história e fazer as crianças sonharem. Francês nascido na ilha de Anjouan (uma das três ilhas da União das Comores), pelo lado do pai, Arnaud Assoumani torce para que este projeto ultrapasse as fronteiras de Mayotte e lhe permita aproximar-se mais de suas vizinhas, as Comores, implementando um projeto de playdagogia nessas outras ilhas.
Mayotte, Play international, meninas
Quatro rostos das mulheres de amanhã
Além de terem gasto muita energia, nesta manhã de terça-feira, elas também aprenderam bastante. Em sua turma da 4a. série do 1o. grau, Manon, Mélie, Inès e Loane descobriram uma sessão de playdagogia. Após um primeiro jogo baseado unicamente no esforço físico, que permitiu que se familiarizassem com suas equipes, as crianças de 10 a 12 anos participaram de uma sequência concebida pela Play International para refletir sobre a noção do estereótipo.

Caixas onde figuravam palavras conotadas e frequentemente associadas a um gênero – "boneca", "louça", "força", "azul" – foram triadas pelos alunos. Sem muita surpresa, "azul" foi classificada em "meninos" e "faxina" em "meninas". Animada por Claire, coordenadora local da Play International, e pelo atleta Arnaud Assoumani, a terceira sequência, relativa ao debate, foi rica em interação com as crianças.

Contudo, rapidamente, apesar da primeira triagem, vozes dissidentes e dedinhos tímidos se erguem: "A força não é só para os meninos. Tem meninas que lutam boxe e jogam rugby", insurge-se um aluno. "Além disso, a força física não é a única que existe", ressalta Arnaud Assoumani. "Vocês sabem quanta força moral é preciso ter para ser mãe? Para cuidar de tudo, o tempo todo?" As crianças escutam atentamente, pensativas. As ideias fluem, as crianças se expressam, a mixidade e a diferença são valorizadas. "Em Madagáscar, tem um monte de meninos que usam rosa", explica a pequena Loane. "A gente pode escolher a cor que quiser", declara a menina com grande sabedoria. Manon, Mélie e Inès acenam silenciosamente com a cabeça. Pouco a pouco, juntas, as crianças caminham para uma sociedade mais aberta e inclusiva.
Mayotte, Play international, Malika
Malika, mudar a sociedade
"Eu quis mudar os códigos, mas me confrontei com todas as dificuldades de Mayotte, ligadas aos pais e à falta de meios financeiros e materiais". De volta a seu território natal, em 2015, após uma série de primeiras experiências profissionais na França metropolitana, Malika, especialista em animação, não pretende se deixar levar pelas adversidades e aproveita cada oportunidade para melhorar o dia-a-dia de seu município. Assim, quando a prefeitura de Chirongui, no sul de Mayotte, onde trabalha como coordenadora periscolar, foi contatada pela Play International, ela simpatizou imediatamente com os valores da ONG.

Nos três centros de lazer que acolhem cerca de cinquenta crianças cada um, fora do horário escolar, a playdagogia soltou as línguas da criançada. Porque as crianças de Mayotte nem sempre falam de tudo na escola ou em casa, e esses momentos privilegiados são uma ocasião para que possam se exprimir. Enquanto brincam com kits pedagógicos inventados pela Play International sobre as desigualdades entre mulheres e homens, "as meninas falam muito do que fazem em casa, da cozinha, da louça", conta Malika. E, apesar de evoluírem numa sociedade matrilinear (onde o patrimônio e o nome de família são transmitidos pela mãe) que confere um lugar importante às mulheres, "os meninos são muito estereotipados e machistas, desde pequenos", constata a coordenadora.

Estes momentos de interação são então cruciais para "quebrar todos esses códigos", afirma Malika, determinada. Valores que os pré-adolescentes levam para casa, para "que os pais também se sintam envolvidos". Todos os anos, uma convenção deveria ser assinada entre a prefeitura de Chirongui e a Play International, permitindo que os animadores do município sejam formados, recebam kits de playdagogia e beneficiem de um acompanhamento das ações realizadas no contexto dessa parceria.
Mayotte, Play international, Arnaud Assoumani
Um suporte da deficiência a desenvolver

Oficialmente certificado em novembro de 2012, o setor medicossocial maiotense "é relativamente jovem", nota a Agência Regional de Saúde Oceano Índico (ARS OI). Assim, o suporte das pessoas com deficiência em Mayotte (10440, segundo a Casa Departamental das Pessoas com Deficiência de Mayotte, das quais 3042 de menos de 20 anos) continua insuficiente, mas tende a se desenvolver. 

O Plano Regional de Inserção dos Trabalhadores Deficientes (PRITH) da ilha recenseou, em 2016, mais de 1700 jovens de menos de 20 anos em situação de deficiência, 800 dos quais beneficiam de um projeto pessoal de escolarização. Quanto ao trabalho, este organismo constatou que, embora 650 adultos fossem reconhecidos como trabalhadores com deficiência, outros 1200 possuíam uma deficiência, mas não iniciaram procedimentos para reconhecê-la. No total, o setor medicossocial propõe 571 vagas (508 para as pessoas com deficiência e 63 vagas de serviços de enfermagem em domicílio).
 
Entretanto, o "Plano de Ação para o Futuro de Mayotte", apresentado pela ministra de Além-Mar, Annick Girardin, em maio de 2018, permitiu a criação, em abril de 2019, do Fundo de Desenvolvimento Social no território. Dotado de um fundo de lançamento de 10 milhões de euros, ele é cofinanciado pelo Ministério de Além-Mar e o Conselho Departamental. Esta verba permitirá desenvolver as estruturas de acolhimento de pessoas com deficiência.
 

A playdagogia se inventa em mayotte

A Play International, em parceria com os stakeholders locais, elabora atualmente o primeiro kit de playdagogia criado em Mayotte. A temática escolhida foi o meio ambiente e, sobretudo, a preservação da água, um recurso vulnerável na ilha. O atleta Arnaud Assoumani, bem como representantes do Conselho Departamental, da Agência Regional de Saúde e da Educação nacional, começaram, em maio de 2019, a conceber juntos quatro jogos destinados ao público nacional, e dois específicos para Mayotte.

Infraestruturas e jogos?
Pela primeira vez, Mayotte depositou uma pasta de candidatura para a organização dos Jogos das Ilhas do Oceano Índico, em 2027. Uma extraordinária oportunidade para desenvolver as infraestruturas esportivas da ilha e permitir que a população beneficie de equipamentos conformes às normas internacionais.

 

Em Mayotte, as infraestruturas esportivas de qualidade são raras. © Ornella Lamberti / AFD
Em Mayotte, as infraestruturas esportivas de qualidade são raras. © Ornella Lamberti / AFD

 

O 101o. departamento francês participa há anos dos Jogos das Ilhas do Oceano Índico (JIOI), que reúnem, de quatro em quatro anos, as sete delegações: Ilhas Maurício, Seychelles, Comores, Madagáscar, Mayotte, Reunião e Maldivas. Mayotte pretende organizar o evento em 2027 e, para tal, entregou uma pasta junto ao Conselho Internacional dos JIOI. O acolhimento dos Jogos permitiria ao território beneficiar de fundos consideráveis para desenvolver e renovar suas infraestruturas esportivas, já que em Mayotte nenhuma é atualmente conforme às normas internacionais. 

O objetivo não é somente acolher esporadicamente esses Jogos, mas oferecer à população de Mayotte equipamentos "dignos" e perenes, como explica Madi Vita, presidente do Comitê Regional Olímpico e Esportivo (CROS). Assim, a ilha está na linha de partida para obter esta vitória para o desenvolvimento do território, que carece cruelmente de equipamentos, especialmente para sua juventude.

Portanto, os talentos existem, os esportistas da ilha perfumada distinguem-se particularmente nos esportes coletivos, futebol, handebol e basquetebol. E as mulheres também jogam, não se importando que a prática de uma atividade esportiva ainda seja considerada "mal vista" para elas, lamenta Madi Vita. Felizmente, os costumes evoluem rapidamente e "de uma geração a outra, basta um piscar de olhos", alegra-se o dirigente do CROS. 

O potencial é, porém, bem real; basta acompanhá-lo rumo à vitória. O Estado contribuiu para essa melhoria, já que, em 2018, quase 4 milhões de euros foram investidos, permitindo financiar dois estádios de futebol e obras de renovação de equipamentos esportivos nos municípios do departamento.